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Máquina do tempo: a moda como mantenedora de tradições

  • Comunicação e Marketing
  • 6 de out. de 2024
  • 4 min de leitura

Conservar a cultura é desafiar o tempo; cultivar a cultura é ressignificar o passado a partir do hoje. O artesanato passou de geração em geração e hoje ocupa lugar de destaque nas passarelas.


Por Vivian Tripodo


A palavra “cultura” vem do latim “colere”, que remete ao cuidado. Nas palavras da  escritora brasileira Marilena Chauí, cultura é a capacidade do ser humano de se relacionar com o ausente. Tornar o ausente presente se dá pela fala e torná-lo tangível se dá pelo trabalho. Ao fazer um recorte de classe, a cultura é separada em subcategorias: a “erudita” e a “popular"; essa segunda é inferiorizada. A cultura é essencialmente humana; “ordinária, igual feijão com arroz”, segundo Gilberto Gil.


O artesanato com trançados e rendas nordestinas possui forte influência indígena e se caracterizam como saberes transmitidos de geração em geração

Faz-se presente o movimento de resgate de raízes e ressignificação de valores das artes e saberes populares. A exemplo disso, o Museo de Sitio de Pachacámac tem como objetivo fazer a curadoria dos materiais arqueológicos encontrados no Santuário Pachacámac, localizado no Peru. Os artigos têxteis lá encontrados são objetos de estudo: a partir desses é possível compreender a organização social, o dia a dia e as tecnologias da época. 


Iconografia dos tecidos de Pachacámac / Foto: Livro Textiles de Pachacámac


Ao cultivar o passado, além de ressignificar aspectos, que outrora foram subjugados, podemos compreender melhor o presente. Os bordados da família Diniz Dumont são exemplo disso:  se inspiram no bordado mineiro clássico, porém rompem com o tradicional já que exploram novas técnicas para contar sua história. 


"Assim fizemos as primeiras leituras, ouvindo curiosos os causos contados por papai e observando atentos os barrados dos vestidos e as histórias bordadas por mamãe”, relata Antônia Zulma Diniz Dumont

Obra: Ciranda / Família Diniz Dumont


Os bordados da família Diniz Dumont narram “as entrelinhas da vida com leveza, intensidade, alegria e solidariedade; cientes do efêmero de tudo que vem e que passa”, conta Antônia. 


Moda e artesanato: sustentabilidade? 


Essa interseção dá origem a uma tríade que não é passageira; surge como devolutiva às questões socioecológicas consequentes do impacto da indústria. A união entre moda, artesanato e sustentabilidade fomenta a diversidade cultural e a responsabilidade de um futuro ético e sustentável.


Trazer o artesanato para uma moda sustentável é valorizar não somente a mão de obra, mas também estimular a preservação cultural. 


Foto: Catarina Mina


O produto artesanal vem carregado com uma carga identitária, repleta de informações subjetivamente injetadas em seu processo de construção

Além disso, o artesanato é o produto final de um trabalho humano; é único e carrega tradições. É devagar, expressa paciência e atenção: vai na contramão da voraz indústria. Entretanto, as tecnologias possibilitaram a mimetização do artesanato: esvazia a cultura e ocupa o espaço da mão que transmite o saber manual. 


O artesanato nas passarelas brasileiras


A última edição do SPFW foi cenário da inclusão da moda artesanal. A marca Catarina Mina, O projeto Ponto Firme e o Projeto Cria Costura carregam consigo o fazer manual, o culto à tradição e a promoção de um ambiente de geração de oportunidade.


Foto: Catarina Mina


Catarina Mina: mais importante que o artesanato, só a artesã!


A marca Catarina Mina, fundada há mais de 15 anos por Celina Hissa, tem como objetivo criar um cenário na qual a moda sustenta-se em um futuro colaborativo no qual os laços entre artesãos, designers e a sociedade sejam reinventados e fortalecidos. Para isso, a marca se compromete em promover cursos de capacitação e em expor quem fez a peça comprada: toda peça vem com um QR Code na etiqueta que nos permite conhecer a artesã. 


Foto: Catarina Mina


Projeto Cria Costura: a construção de uma economia regenerativa


O Projeto surgiu em 2021 como uma iniciativa da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho, em conjunto do Instituto Nacional de Moda, Design e Economia Criativa, para o desenvolvimento de talentos na área da costura. As peças produzidas apresentam consciência sobre a moda, com isso não só os participantes do projeto são beneficiados como também o meio ambiente. Utilizam o método “zero waste” que proporciona a maximização do proveito do tecido, prevenindo a geração de resíduos têxteis. 


Foto: Fashionnetwork


"O programa Cria Costura proporciona não apenas o desenvolvimento de habilidades técnicas, mas também uma oportunidade de empoderamento e transformação de vidas. Ao capacitar essas mulheres e homens da periferia, estamos abrindo portas para que elas conquistem seu espaço na indústria da moda e alcancem uma maior independência financeira e realização pessoal”, comenta Jefferson de Assis, coordenador do curso. 

Projeto Ponto Firme: autonomia e reinserção social


Surgiu em 2015 a partir do sentimento do estilista Gustavo Silvestre de “autonomia”. Após um convite para ministrar aulas de crochê dentro de uma penitenciária masculina, o projeto se desenrolou. O projeto não engloba somente os detentos, mas também atende egressos desse sistema. A primeira coleção desfilada no SPFW foi em 2018 e tinha como inspiração o cotidiano e memórias dos artesãos. 


Foto: Danilo Sorrino


“É praticamente uma terapia. Cada pensamento nas minhas filhas e na minha esposa eu coloquei nos pontos”, relata um participante do projeto

O passado, o presente e o futuro em todo lugar ao mesmo tempo


O papel do artesanato rompe a barreira do tempo e permite que o futuro seja reescrito; é a marca mais crua da passagem do tempo e a transformação do mesmo pelo ser humano.


Na próxima edição do SPFW, que acontecerá dos dias 14 a 21 de outubro, os projetos Cria Costura, Ponto Firme e a marca Catarina Mina participarão nos dias 14 e 17, respectivamente. A tradição se mantém viva por meio do cultivo e da possibilidade de permanência. 


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