DESCARTES TÊXTEIS E O COLONIALISMO AMBIENTAL
- Comunicação e Marketing
- 22 de jun. de 2022
- 2 min de leitura
Por Victoria Guimarães
Colaboradora Priscila M. Areco
22 de Junho de 2022
Não é novidade que a indústria têxtil é uma das menos sustentáveis do mundo; com processos durante a produção que emitem altos níveis de gases efeito estufa e geram grande poluição aquática, além de exploração petrolífera.
No entanto, a insustentabilidade dessa área não se resume aos primeiros passos da confecção de uma peça. Em uma era de economia linear, em que se predomina o modelo "extração-consumo-descarte", esse último vem causando diversos impactos negativos em regiões que, não coincidentemente, predominam países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, ainda que esses não sejam os maiores consumidores globais.
É o caso do deserto do Atacama (Chile), que há anos vem servindo como depósito de lixo têxtil proveniente da Europa, Estados Unidos e Ásia, tendo aproximadamente 300 hectares ocupados. São principalmente roupas de segunda mão, que não encontrando finalidade nos países do Norte Global, são exportadas para o Chile para serem revendidas em feiras locais. No entanto, tais feiras não conseguem abarcar o volume de 40 mil toneladas anuais de peças, que acabam sendo descartadas na região de Alto Hospicio. O problema reside no fato de que a maioria dessas peças, de marcas como H&M, Wrangler e Nike são feitas de poliéster, material que demora anos para se decompor causando um quadro de contaminação no local. Além disso, diversos incêndios são provocados na tentativa de diminuir a quantidade das pilhas, gerando quadros de doenças respiratórias nas populações próximas.

Pilhas de lixo têxtil no Atacama (Nicolás Vargas/ BBC, 2022)
Na África a situação é semelhante, ocasionando não apenas problemas ambientais, como socioculturais.
O mercado de Kantamanto, em Gana, costumava ser parte da cultura têxtil local no qual através do Upcycling, costureiras e alfaiates transformavam peças de vestuário usadas dos moradores em novas roupas, gerando um sentimento de ressignificação e contribuindo para a formação de uma identidade cultural. No entanto, o mercado passou a se tornar receptor de roupas de segunda mão provenientes de países europeus, e a quantidade exorbitante acabou por exceder a capacidade suportada pelos artesãos do local. A procura por peças customizadas também diminuiu, uma vez que as usadas importadas são vendidas a valores muito mais baixos.

Mercado de Kantamanto
O mesmo ocorre na cidade de Kampala, Uganda; um país que, mesmo produzindo um algodão de altíssima qualidade há mais de um século, foi invadido pelo lixo têxtil dos países desenvolvidos, derrubando a produção local pela concorrência de roupas usadas por valores mínimos.
Situações como essa levantam um debate acerca do colonialismo ambiental, uma vez que os países que mais consomem são aqueles mais desenvolvidos, com uma economia estável; estando os Estados Unidos e China liderando o ranking dos maiores produtores de lixo no mundo. É contraditório então que esse lixo seja direcionado para países subdesenvolvidos, já com uma carga colonial muito forte. A promoção de uma economia circular interna nesses países do Norte Global seria o ideal para um equilíbrio sustentável tanto no quesito ambiental como sociocultural, mas parece algo utópico de se pensar em uma sociedade regida pelo capitalismo.
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